Em Novo Oriente (CE), poder público e população se unem para fazer o enfrentamento da evasão escolar
O “Dia ‘D’ da Busca Ativa Escolar” mobiliza os poderes Executivo e Legislativo para sair às ruas da cidade cearense a fim de identificar crianças e adolescentes fora da escola; na foto, equipe da SME sai às ruas para buscar crianças fora da escola
O maior esforço da Secretaria Municipal de Educação (SME) de Novo Oriente (CE) é conquistar as crianças e adolescentes de forma que gostem de estudar e frequentar as escolas. Um trabalho que passa por deixar o ambiente escolar a cara dos meninos e meninas, segundo Renata Cavalcante, superintendente de Ensino do município. O objetivo é criar neles(as) um sentimento de pertencimento, motivação e identificação.
“Fazemos um trabalho com um olhar sensível para todos os nossos alunos. É um trabalho que requer muito cuidado, muito zelo”, afirma Renata Cavalcante. “A busca ativa não se restringe de ir até as residências dos alunos e querer que eles voltem, mas sim dar condições para que eles realmente retornem para as escolas e que queiram permanecer. É um trabalho de resgate”, complementa.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022, a população da cidade cearense era de aproximadamente 27,6 mil habitantes, sendo que desses cerca de 5,5 mil estavam na faixa etária de 0 a 14 anos. Em 2010, a taxa de escolarização de 6 a 14 anos de idade era de 97,9%; e em relação ao Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), em 2023, a nota era 9,5 para os anos iniciais do Ensino Fundamental (EF) na rede pública e para os anos finais, de 8,2. Atualmente, o município tem cerca de 25 escolas de EF e aproximadamente 5,5 mil alunos(as).
Agentes municipais mobilizados no Dia D da Busca Ativa Escolar 2025 | O grupo é composto por agentes de saúde, educação, assistência social, entre outros |
Para fortalecer as ações municipais de enfrentamento do abandono, evasão e exclusão escolar, o município cearense aderiu à Busca Ativa Escolar (BAE) em 2017, estratégia que conta com uma metodologia social e uma plataforma tecnológica que apoia os governos estaduais e municipais na identificação, registro, controle e acompanhamento de crianças e adolescentes que estão fora da escola ou em risco de evasão. Inclusive, uma mostra do seu compromisso com a garantia do direito à educação para crianças e adolescentes, Novo Oriente tem a primeira-dama, Iara Torres, como a atual coordenadora operacional municipal da BAE.
“Uma de nossas principais ações é o ‘Dia D da Busca Ativa Escolar’. Este ano, antecipamos a mobilização e fomos a várias escolas, em todos os setores públicos do município e na rádio, convidar a todos para apoiar as ações de enfrentamento da evasão escolar. É um movimento muito bem elaborado”, explica Iara Torres. “O nosso trabalho não é só da equipe da Secretaria de Educação, envolvemos os agentes de endemias, de assistência social, de saúde. Inclusive, os agentes de saúde são a porta de entrada da Busca Ativa Escolar nas famílias, porque eles conhecem bem as comunidades e os bairros”, ressalta a primeira-dama.
O “Dia D da Busca Ativa Escolar” é um marco anual da estratégia no município cearense e alcança todo o território de Novo Oriente. Conta também com a participação do prefeito, Eduardo Coelho, e dos vereadores, que no “Dia D” saem às ruas juntamente com os demais agentes municipais para visitar todos os bairros, conscientizando a população sobre a importância de as crianças e adolescentes frequentarem assiduamente a sala de aula.
“Eles levam uma ficha, nessas visitas, para já preencher as informações dos casos encontrados, não importando se é uma demanda de Ensino Básico, Fundamental, Médio ou de Jovens e Adultos. Registramos todos os casos de quem tem interesse de estar na escola”, diz Ruth Torres, supervisora institucional municipal da Busca Ativa Escolar. “Este ano, identificamos no ‘Dia D’ uma criança que estava sem documento, e graças à mobilização, encaminhamos a família para a Assistência Social e a mãe já está com o documento em mãos”, conta.
Em 2025, o “Dia D” novorientense foi realizado no dia 21 de fevereiro e foi prestigiado pela Ronda Escolar de Crateús, município vizinho. Nas redes sociais, foram produzidos e postados vários vídeos com as autoridades locais falando sobre a estratégia e as ações municipais em prol do enfrentamento da evasão escolar. A equipe chegou a escrever uma música, que foi gravada por um professor e uma aluna e ganhou videoclipe. No “Dia D”, a canção embalou as ações da BAE na cidade. A equipe da estratégia contratou um carro de som para percorrer as ruas de Novo Oriente tocando a música.
No DIa D da BAE 2025, os cidadãos podiam tirar dúvidas e solicitar | Carro de som percorreu as ruas da cidade tocando paródia escrita e |
Estrutura e desafios
O município montou um plano de ação anual e criou o Comitê da Busca Ativa Escolar, integrado por representantes da Coordenação do Programa Saúde na Escola (PSE), Conselho Tutelar, Câmara Municipal de Novo Oriente, da escolinha de futebol e ainda a vice-prefeita, Ivoneide Chaves.
“Aqui no município, temos um projeto voltado para a infrequência, que é uma das raízes para uma futura evasão. Então, já trabalhamos nessa perspectiva de dar um apoio mais expressivo para as escolas. Fazemos o acompanhamento das crianças e adolescentes e das famílias e, se não conseguimos resolver, passamos os casos para as instâncias competentes”, explica Ruth.
A equipe municipal da BAE também é integrada por profissionais das secretarias de Educação, Saúde e Assistência Social; e das instituições escolares, como diretores, coordenadores e professores. Além disso, o governo local possui parceria com o Ministério Público e regime de colaboração com as escolas estaduais, que na cidade são apenas três, uma delas indígena.
Ruth Torres (esq.), supervisora institucional; Iara Torres, primeira-dama e coordenadora operacional; e Wemerson Sorares (dir), técnico verificador | Secretária Municipal de Educação de Novo Oriente, Cristianne Sampaio, conversa com o time da Ronda Escolar de Crateús, durante visitas domiciliares |
As ações partem da apuração minuciosa dos(as) alunos(as) que frequentaram a rede municipal de ensino no ano anterior mas não realizaram a rematrícula no ano corrente. O time acompanha ainda a frequência dos alunos da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE). “Em 2025, já regularizamos a situação de todos aqueles que iniciaram o ano letivo sem rematrícula. Quem faltou é porque não vive mais em nossa cidade”, relata a supervisora institucional.
A escolinha de futebol é um dos principais incentivos que o município oferece para as crianças e adolescentes assistirem às aulas. “Só vai para escolinha de futebol quem está indo para o colégio, quem está faltoso não pode participar”, esclarece Iara Torres.
Acolhimento
Aos diretores, coordenadores e professores cabe acompanhar de perto a frequência dos estudantes, e buscar identificar diariamente os motivos das faltas. Os casos nos quais as ausências são mais recorrentes são encaminhados para a equipe da BAE de Novo Oriente.
“Temos casos de alunos totalmente ansiosos, inclusive há crianças sofrendo de ansiedade. Gravidez na adolescência é outro fator. Esses são os dois maiores grupos (de estudantes mais infrequentes)”, detalha a supervisora institucional municipal da BAE.
Para Wemerson Soares, psicólogo e técnico verificador da BAE no município, o uso do celular contribui para que esses alunos(as) estejam mais ansiosos. Além disso, na adolescência, as transformações biológicas e socioculturais pelas quais esses meninos e meninas passam interferem na forma como eles(as) se expressam – ou não – e lidam com o mundo e, consequentemente, impactam a sua jornada educacional.
“Tem adolescentes que querem trabalhar, mas como as escolas estaduais e algumas municipais estão em ensino integral, eles relatam que não conseguem ficar o tempo todo na escola, porque querem ajudar em casa. Começam faltando e acabam abandonando (os estudos)”, aponta Soares.
“Também observamos muita dificuldade de comunicação e casos de abandono afetivo e ainda de isolamento social, algo comum nessa fase. Junta-se a isso o despreparo dos pais para este novo mundo de informações nas redes sociais, no celular. Os adolescentes se isolam no mundo deles e não sabem pedir ajuda ou até mesmo tirar alguma dúvida com os responsáveis, muitas vezes por medo de não serem compreendidos”, complementa Wemerson, destacando que a rede municipal conta com nove psicólogos para atender as demandas dos estudantes de Novo Oriente. Se necessário, esses(as) alunos(as) são encaminhados para o núcleo de atendimento psicossocial da cidade.
“A gente vai na casa deles, a gente acolhe, faz intervenções sem nenhum tipo de julgamento. Tenta acolher aquela família de alguma forma para que ele (o/a adolescente) volte para a escola e veja no ambiente escolar um espaço para colher frutos lá na frente; e reconheça a importância da escola na vida dele”, ressalta Soares.
Quando esses meninos e meninas faltosos vivem em situações de extrema vulnerabilidade, a equipe da Secretaria de Educação recorre a outros órgãos municipais para fazer valer os direitos deles(as). “A gente tenta buscar alguma política pública para que essas crianças se sintam acolhidos e protegidos e com os direitos deles garantidos”, reforça o técnico verificador.
Primeira-dama, Iara Torres, conversa com criança durante visitas domiciliares no Dia D da BAE 2025
Fotos: SME de Novo Oriente